Doutora, como você consegue lidar com o ambiente de um hospital de câncer?

Sim, o hospital é um lugar de dor e perda, mas também é um lugar de esperança e fé… É ali que são feitas as orações mais sinceras… os corações mais quebrantados e os louvores mais espirituosos. É ali que há tanta gente que realmente confia em Deus… É ali que existem os verdadeiros arrependimentos… (geralmente de coisas que se deixou de fazer… queria ter amado mais, viajado mais, ter visto o sol se pôr…) É ali que existem verdadeiras mudanças e adaptações de vida – sondas, tubos, drenos, ostomias, amputações, restrições… É ali que a pessoa mais orgulhosa precisa de cuidado e aprende com isso… e onde a pessoa mais humilde sempre tem algo a oferecer. É onde todo mundo precisa de ajuda, desde o paciente até o diretor … Onde ninguém promove cura nem é curado sozinho. Onde tem enfermagem, nutrição, fisioterapia, psicologia, fonoaudiologia, serviço social e médico buscando o melhor para cada paciente… É onde se vêem grandes sacrifícios de amor… e grande compromisso… familiares, acompanhantes que dormem (às vezes nem dormem) dias, semanas, meses em cadeiras desconfortáveis… filhos, pais, maridos, esposas, irmãos, amigos… que abrem mão do conforto de suas casas e do sono tranquilo, às vezes dos seus empregos, e outros compromissos para estar junto do seu ente querido. É onde se vê uma família inteira se mobilizando e revezando, às vezes brigando pra ver quem fica hoje… É onde se vê gente que pega fila dias inteiros para cada exame que você pede para o familiar querido… que entra na vã ou ônibus na madrugada , viaja por muitas horas e depois senta mais um dia todinho aguardando para acompanhar a consulta. É onde o sorriso custa tão pouco… a permissão para beber uma água, a permissão para dieta livre, a retirada de uma sonda, a permissão para deambular, a alta para casa mesmo quando se sabe que não houve o resultado desejado. É onde as pessoas refletem sobre o que é realmente felicidade e sobre o que realmente importa na vida. É onde existe verdadeira gratidão demonstrada… e de tantos presentes e mimos que já ganhei de pacientes… não há satisfação maior do que um “Deus usou a suas mãos”… nada mais recompensador do que um sincero “Deus te abençoe, doutora”… nada mais fortalecedor do que “Deus te ilumine”… É onde eu vejo a minha vocação fazer sentido e onde eu recebo mais do que dou… em lições de vida, em orações, em carinho. É por isso que eu amo estar no Hospital do Câncer.

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